Resenhas
O
desafio da renovação
Por Vera
Rodrigues Silva
Estão
reunidos no livro, conferências, artigos, resenhas, prefácios
de livros (como o organizado pelo autor e pela pesquisadora
Maria Beatriz F. Rahde para o livro "Memórias das
ciências da comunicação no Brasil: o grupo
gaúcho" e o apresentado pelo autor e por Jorge Duarte
no trabalho "Memórias das Ciências da Comunicação
no Brasil: os grupos do centro-oeste"), nota sobre o pioneiro
Raymond Nixon, publicada em revista brasileira e norte-americana,
além de alocução proferida na sessão
de abertura do XXV Congresso Brasileiro de Ciências da
Comunicação da UNEB, setembro de 2002.
Nestes
trabalhos, apresentados tanto no Brasil como em diversos outros
países, o professor José Marques de Melo apresenta
um resumo de sua importante e fértil contribuição
não apenas para o estudo, mas da própria instituição
da ciência da comunicação no Brasil e a
divulgação do pensamento comunicacional brasileiro
para o mundo.
Considerada
paradigmática e referência obrigatória para
os pesquisadores mais jovens ou mesmo para os já com
trajetória definida na área da comunicação
social, a obra do professor Marques oferece uma visão
pluralista do tema, buscando as origens do pensamento ocidental
lá atrás, no século III antes da era cristã,
com base nos postulados do filósofo grego Aristóteles,
configurado depois em Quintiliano (filósofo romano, século
I da era cristã), situando outros autores continuadores
desta linha, como Peucer e Shramm.
Atém-se
ao pensamento do cientista político Harold Lasswel, que,
já contando com os colaboradores Smith e Casey, amplia
o primitivo sentido aristotélico (propaganda-persuasão),
para colocar as questões que envolvem todo o processo
de comunicação massiva e define elementos de análise,
classificados em canais, comunicadores, conteúdos e efeitos,
que são as quatro fases de qualquer ato comunicativo.
Esta linha de raciocínio consegue lançar luz sobre
o estreito território que separa comunicação
e política, nas primeiras décadas do século
vinte marcado por guerras entre muitos países.
Nesta
vertente nitidamente bélica da comunicação,
se insere um elemento novo utilizado pela política para
influenciar as massas: a propaganda, claramente manipulada sempre,
pelos dois lados em conflito, cada qual se dizendo detentor
da verdade. Aliás, a força do argumento propaganda
política para convencimento das massas, pode ser sentida
neste início de século, em momentos sintomáticos:
o da guerra anglo-americana contra o Iraque e nas últimas
eleições brasileiras, onde a propaganda política
- chamada eufemísticamente "marketing político"
- foi elemento determinante para convencer os eleitores.
Fechando
o parêntesis e voltando ao texto, relembremos que no trabalho
em análise se considera que o elo de ligação
no estudo científico da comunicação é
a relação estabelecida por Aristóteles,
entre a Política e a Comunicação (especificados
em duas obras do filósofo, a Política e a Retórica).
Esta linha de raciocínio liga os precursores do estudo
da comunicação, aos profissionais tanto da atuação
na mídia nas sociedades pós-industriais, como
os pesquisadores da comunicação enquanto ciência,
buscando o aprofundamento da reflexão, da forma plural
interdisciplinar e comparativa.
Dividido
em dois grandes blocos (I - Cenários e II - Personagens),
com subdivisões em capítulos específicos,
o trabalho permite uma visão ampla do campo da comunicação,
sua evolução histórica, do conhecimento
da natureza do conhecimento, a formação de uma
identidade brasileira, depois avançando em direção
á formação de um pensamento comunicacional
latino-americano e outra vertente,que seria o pensamento comunicacional
luso-brasileiro.
Nos
textos referentes à primeira parte, Cenários,
fica evidente não só a retrospectiva histórica,
da luta dos pioneiros para instituir no Brasil a sistemática
da comunicação como objeto de estudo - pesquisa
científica e formação de profissionais
para o mercado midiático, que a partir as Segunda Guerra
cresce vertiginosamente, apoiado no desenvolvimento de suporte
tecnológico de difusão da informação.
Propõe
também a formação de um modelo latino-americano,
que englobasse posturas comuns com relação a mídia,
linguagem, tecnologia e cultura. O caminho a ser seguido deve
ser um meio termo entre o radicalismo europeu, marcado por forte
contingenciamento ideológico e o instrumentalismo norte-americano,
voltado para pesquisas empíricas, e mais preocupado em
atender as demandas empresariais. Segundo o professor Marques
de Melo, os pioneiros da escola Latino-Americana queriam efetivamente
ter uma participação mais efetiva na cena comunicacional,
mas mais comprometidos com o interesse público e não
presa do corporativismo dos empresários ou mesmo de militantes
ligados à burocracia estatal.
Dentro
do campo Natureza do Conhecimento Midiológico, questionamentos
sobre como se desenvolve um novo campo do conhecimento, levando
sempre em conta as demandas coletivas e considerando a importância
da confluência das fontes, praxis e teoria. Também
se preocupa com as estratégias a serem adotadas para
que a Universidade se aproxime mais da comunidade, não
se concentrando num encastelamento que já aconteceu em
outros tempos.
Na
Segunda parte, Personagens, o objetivo é uma reconstituição
das histórias de vida dos principais cientistas brasileiros
da comunicação, aqueles que foram, por assim dizer,
pavimentando o caminho do desenvolvimento do estudo e da pesquisa
na área de comunicação de massa no Brasil.
O trabalho, uma espécie de "banco de dados",
um verdadeiro estudo de arqueologia intelectual, como ressalta
o professor.
Figuras
destacadas dentro da história da formação
do pensamento comunicacional brasileiro, como Frei Caneca, Costa
Rego, Carlos Rizzini e Luiz Beltrão, além de referências
paradigmáticas do pensamento comunicacional americano,
como Raymond Nixon, Elihu Katz, Luiz Ramiro Beltrán e
Jesús Martin Barbero, ajudam a visualizar, formar um
completo painel sobre os caminhos da informação
e do desenvolvimento da comunicação de massa,
vista como ciência da comunicação.
O
grande desafio que o professor Marques de Melo propõe,
é um avanço no pensamento comunicacional brasileiro,
em direção ao desafio da renovação,
diante das mudanças que se começaram nas últimas
décadas do século passado e se tornam presentes
com toda força, neste início de século
XXI, a já chamada Era da Informação.
Com
relação a estes questionamentos, ganha relevância,
no capítulo O Grupo de São Bernardo, o texto base
da Comunicação apresentada ao III Congresso Lusófono
de Ciências da Comunicação, realizado na
Universidade do Minho, em Braga, Portugal, onde é relatada
a vivência dos participantes do Programa de Pós-Graduação
em Comunicação Social da Universidade Metodista
de São Paulo.
O
projeto, que reuniu um contigente de mais de 300 pesquisadores,
além de estudantes jovens que a ele se agregaram, orientados
por mestres e doutores que desenvolveram projetos de ensino
e pesquisa renovadores, buscando uma forma de manter o pensamento
vanguardista e ao mesmo tempo, ajustá-lo às conjunturas
típicas do entorno sociocultural e político-econômico.
Os Processos Comunicacionais propostos representam, sem dúvida,
um significativo avanço no sentido de atender estas novas
demandas.
Como
destaca o professor Marques de Melo, a proposta é confrontar
dialeticamente o industrial e o artesanal, o público
e o privado, o tradicional e o pós-moderno, o internacional
e o local.
Isso
nos parece de suma importância: esta postura aberta e
pluralista, que permite aos pesquisadores se situar e encontrar
um caminho novo, num momento em que a "aldeia global"
estimulada pelas transformações e avanços
proporcionados pelo desenvolvimento tecnológico, estimula
questionamentos, formula mais dúvidas que certezas e
terá, fatalmente, que enfrentar as mudanças políticas
que surgirão no pós-guerra iraquiano e influenciarão
o pensamento comunicacional.
Para
concluir, o perfil intelectual do autor, incluído no
final, é muito oportuno para situar não só
sua trajetória de profissional, pesquisador científico
e consultor acadêmico, mas também mais elementos
para que pesquisador iniciante acompanhe o Paradigma Marques
de Melo.
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