Resenhas
Diário
Popular:
a biografia de um
jornal paulistano
Por
Laercio Arruda*
Introdução
"Um
jornal se constrói com paciência
e se destrói com um gesto de impaciência".
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Reprodução

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A
frase é citada no livro O Papel do Jornal - Uma Releitura,
de Alberto Dines, mostrando que o empenho e a dedicação
devem fazer parte do processo jornalístico.
Dines
alerta que em jornalismo não existe a permanência,
e sim, a persistência. Segundo ele, um visitante despreparado
se surpreende ao entrar pela primeira vez, numa redação
de jornal. Uma vez que no dia seguinte, irá encontrar
nas bancas um jornal organizado, sistematizado e acabado. Ou
seja, o visitante não sabe que o jornalismo é
a ordenação da novidade, rotinização
do inesperado.
Ou
seu corolário: a quebra intencional e programada das
normas, para despertar a atenção pelo contraste.
Dines lembra que o jornalista trabalha com rapidez para completar
cada edição, mas aquela edição se
completa com as seguintes até o infinito. Esta noção
do tempo distendido, intercalada com o tempo sincopado, faz
parte do comportamento físico e psíquico do jornalista.
A paciência dentro da periodicidade é como o processo
de conta-gotas: cada porção é minúscula,
mas todas são importantes para atingir a imagem final.
"O
jornalista deve assimilar a periodicidade do seu veículo,
ou seja, deve incorporar ao seu comportamento a noção
temporal fornecida por essa periodicidade. Um veículo
mensal oferece um intervalo e, por conseguinte, uma noção
temporal radicalmente diversa daquela do jornal. A comunicação
através de um sistema de periodicidade rápida,
como o jornal, é um processo quase contínuo.
Em jornal não se pode dizer que uma edição
está fechada, pois enquanto a máquina estiver
rodando deve o jornal ser alterado para receber as novas notícias
ou os desdobramentos daquelas já compostas. E afinal,
quando acabou a tiragem e as máquinas estão
sendo limpas, começa a equipe seguinte a dar a suíte,
ou continuidade, à edição que já
está nas ruas". [1]
E
é exatamente diante desse conceito que percebemos o dinamismo
de um jornal diário. Ele se move rapidamente, mas sempre
apresentando "capítulos" seqüenciais de
um fato importante. Essa interligação existente
entre as edições proporciona ao veículo
uma grande velocidade na divulgação das notícias
atendendo prontamente aos anseios do leitor.
Diferentemente
do rádio (som) e da televisão (imagem), consideramos
que o jornal leva a vantagem da escrita. A notícia impressa
torna-se um documento, onde as informações podem
e devem ser assimiladas e interpretadas pelos leitores. O rádio
e a televisão ganharam no tempo, mas não no conteúdo.
O
mesmo fenômeno podemos constatar com o surgimento da Internet,
que apresenta uma velocidade na divulgação das
notícias, no entanto, com margem muito grande de erros
e desvios de informações. "Todo jornal continua
amanhã", afirma Dines. E no processo jornalístico
um título conduz ao texto, que leva a outro título,
que, por sua vez, faz virar a página, e assim por diante,
até a edição do dia seguinte. Os veículos
impressos têm em sua embalagem todo um aparato de logotipos,
estilos de paginação, marcas, personalidade, linhas
de conduta e coerência. "O sucesso de uma edição,
para ser mantido vivo, exige o sucesso da edição
seguinte".
Acrescentamos
ainda que, além da qualidade do noticiário, o
jornal deve contar com um atraente projeto gráfico. Hoje,
um bom visual pode tornar a leitura muito mais fácil
e agradável, passando ao leitor uma sensação
de eficiência e credibilidade. A persistência das
seções, das reportagens bem determinadas e uma
seqüência lógica das informações
podem proporcionar ao veículo impresso uma boa vantagem
sobre os concorrentes.
A
continuidade de um noticiário é uma característica
importante de um veículo impresso. Mas para isso, é
preciso que haja uma interligação eficiente e
que ofereça ao leitor um panorama geral sobre o assunto.
É possível prender um leitor a uma determinada
matéria, mesmo que ele não tenha acompanhado o
desenrolar dos fatos desde o início. Isso pode ser feito
através de alguns recursos gráficos e boxes, mostrando
a origem dos acontecimentos. Esse é um recurso muito
utilizado na Folha de S.Paulo, e aplicado não
com muita freqüência pelos concorrentes.
Portanto,
o leitor não tem obrigação de conter um
arquivo particular de todas as informações. Entendemos
que isso pode e deve ser feito pelo veículo de comunicação.
Afinal, uma prestação de serviços também
abrange todo um aparato proporcionado ao público alvo.
Nada melhor, do que tratar muito bem o cliente "para ele
voltar sempre".
Ao
longo dos anos, os jornais forçosamente modificaram sua
estrutura editorial com textos mais enxutos e objetivos, e ainda,
com recursos gráficos que tornavam as páginas
muito atraentes. Acreditamos que tais mudanças ocorreram
principalmente nas décadas de 60 e 70, quando a televisão
já se apresentava muito mais disposta a concorrer por
uma fatia maior do mercado de comunicação. Durantes
essas décadas, os jornais passaram do linotipo para a
impressão offset e, posteriormente, para a informatização
total de seu processo. Nessa transação, o jornal
diário transformou-se em um produto compatível
às necessidades da área comercial. Daí,
a luta entre os concorrentes pelos famosos classificados.
Seu
noticiário, ao mesmo tempo, teve também de assumir
uma postura condizente, sendo flexível diante da exigência
de um espaço comercial mais amplo. O número de
páginas aumentou, mas não por exigência
de sua linha editorial.
Passada
a euforia do rádio e da televisão, o jornal mostrou-se
estável no mercado, porém, com um perfil diferente
no aspecto editorial. Todo o noticiário foi reduzido
em nome da maior agilidade e versatilidade. O processo industrial
não permitia um trabalho mais elaborado, e o próprio
repórter teve de se adequar às exigências
do veículo que não dispunha de tempo suficiente
para trabalhar o assunto com maior profundidade. As notícias
passaram a ser redigidas telegraficamente, com o uso dos famosos
lides - como a parte principal da matéria - a utilização
das retrancas e gráficos para uma melhor compreensão
por parte do leitor.
A presença de uma nova tecnologia - microcomputadores
-, na década de 80, ainda sem a participação
da Internet no mercado, estimulou reformulações
importantes nos grandes jornais, como por exemplo: Folha
de S.Paulo, O Estado de S.Paulo, Folha da Tarde, Notícias
Populares e Diário Popular (hoje Diário
de S.Paulo). Todo o empenho e investimento eram válidos
para se conquistar uma faixa cada vez maior de mercado.
Acreditamos
que os jornais sempre concorreram entre si, não se preocupando,
por exemplo, com a existência de um novo veículo
de comunicação - rádio, TV e, atualmente,
a Internet. A preocupação com a área comercial
também forçou os jornais a mudarem suas fórmulas
diante de seus leitores, fossem eles da classe A, B, C ou D.
No início dos anos 90, os principais jornais de São
Paulo mostravam uma nova "cara" e traziam algumas
surpresas nos finais de semana, oferecendo brindes, prêmios,
coleções e demais sorteios aos seus leitores.
E o noticiário? A pressão industrial e comercial
impôs mudanças no processo jornalístico.
Instalou-se
às sextas-feiras os famosos "pescoções"
- ou seja o fechamento da edição de domingo foi
antecipada, prevalecendo assim as chamadas matéria "frias"
ou especiais, trabalhadas com um tempo mais amplo, através
de entrevistas, pesquisas e complementos gráficos. Tais
matérias passaram a ocupar maior espaço, sendo
inclusive motivo de chamadas principais nas primeiras páginas.
Dentro desse quadro podemos analisar o seguinte: os jornais
no início dos anos 90 já estavam se semanalizando
por intermédio de cadernos tradicionais como o de Automóveis,
Turismo, Agropecuário, Páginas Femininas, e de
novidades como os de Informática, Consumidor, Economia,
Investimento, Imóveis, etc.
A
consagração desse processo jornalístico
provocou mudanças nas editorias que receberam novas denominações.
É preciso destacar também que o fim da revisão
nos jornais, causou a queda na qualidade dos textos e do próprio
noticiário. Consideramos que o papel do revisor era importantíssimo
na correção gramatical, assim como sempre foi
importante também a função do copidesque
como o responsável pela adequação e ajuste
dos textos no fechamento da edição. A "cadernalização"
ou "revistalização" , não importa
qual a classificação que possa ser atribuída
a essa mudança nos jornais diários. O importante
é que houve uma queda na qualidade do noticiário,
não apenas em termos de espaço, mas também
na elaboração, no objetivo de se passar ou transmitir
a informação ao leitor. Ou seja, no ato de comunicar.
A
arte do texto foi relegada a um segundo plano, já que
os veículos impressos passaram a privilegiar a produção
gráfica. Sem dúvida, uma boa embalagem muitas
vezes ilude o comprador. No entanto, defendemos o ponto de que
o jornal necessita manter aspectos importantes que o tornaram
um veículo imprescindível. Entendemos que o jornal
deve informar, orientar e educar. Infelizmente, tais características
não vêm sendo observadas pelos grandes jornais.
Há negligência na apuração e na checagem
das notícias, o que resulta no desencontro de informações,
confundindo e impedindo uma compreensão melhor por parte
do leitor. A dificuldade de um veículo de se manter independente
não pode ser um obstáculo na transmissão
de um noticiário objetivo e confiável.
Esse
período de transição e conflito interno
dos jornais, provocou uma oscilação no mercado
e resultou no fechamento do jornal A Folha da Tarde -
transformando-se no Agora - e do Notícias Populares
(Grupo Folhas). Mas as dificuldades, principalmente econômicas
e financeiras continuaram atingindo outras jornais no início
do século XXI. O Diário Popular, adquirido pela
Info Globo, deu lugar ao Diário de S.Paulo, um
titulo que circulou até o início da década
de 70, e que pertencia aos Diários Associados
de Assis Chateaubriand. As aquisições e fusões
constatadas em outros setores de atividades estão se
repetindo na área da comunicação. A exemplo
dos Estados Unidos e Europa, no Brasil também vem ocorrendo
uma forte concentração de grupos que visam dominar
o mercado da comunicação.
Os
grandes conglomerados já dominam os setores impresso
e eletrônico. A própria Internet abriu um espaço
a mais para que esses poderosos grupos tenham uma participação
bastante ativa no setor. As mudanças na área de
comunicação ocorreram de forma mais incisiva nos
Estados Unidos. Hoje, os veículos impressos (jornais
e revistas) tentam transpor as barreiras impostas pelos efeitos
da televisão. O aprimoramento do telejornalismo no início
dos anos 60 e o grande boom registrado nos anos 80 -
por exemplo com a CNN transmitindo notícias ininterruptamente
- contribuíram ainda mais para reduzir o função
exercida pela mídia impressa.
De
acordo com James Fallows - Detonando a Notícia
-, jornais e revistas estão enfrentando verdadeiros desafios
desde a década de 50 para descobrir um caminho onde possam
oferecer algo mais ao leitor, já que o rádio e
a TV passaram a proporcionar ao público todos os acontecimentos
do dia anterior. "Os jornais começaram a oferecer
artigos mais analíticos e interpretativos. As revistas
continuam se debatendo para descobrir o que podem oferecer de
novo e de melhor, numa época de saturação
de notícias dadas pela TV, e análises cada vez
mais sérias dos acontecimentos, oferecidas pelos jornais".
[2]
Segundo
o autor, a chegada dos canais pagos e a "nova mídia"
(Internet) também exerceram fortes pressões sobre
o ramo jornalístico influindo inclusive sobre os repórteres,
cujo trabalho diminuiu em importância, pois não
sabem se o público nota a diferença entre uma
cobertura jornalística boa e uma ruim.
Ainda
nesse mesmo raciocínio lembramos que nas duas últimas
décadas os jornais locais americanos têm sido adquiridos
por cadeias jornalísticas nacionais. Com isso, os jornais
do interior que pertencem há gerações a
uma família começam a usufruir de vários
benefícios, inclusive com maior liberdade de ação
sobre seus "inimigos". O mesmo não acontece
com uma cadeia de jornais, cujos proprietários se mostram
dispostos a reduzir o tamanho das redações a fim
de cortar despesas e atingir lucros predeterminados. Fallows
lembra que a Gannett é a maior cadeia jornalística
dos Estados Unidos, com quase duas dúzias de estações
de rádio e de TV, com seus quase cem jornais e um lucro
de US$ 800 milhões em 1994 (17% a mais do que no ano
anterior).
Para
ele, é significativo o fato de os quatro jornais mais
respeitados do país - New York Times, Washington Post,
Los Angeles Times e Wall Street Journal - estarem
fora desse monopólio. Todavia, a tendência à
"redução" que transformou totalmente
a indústria americana também foi sentida por esses
tradicionais veículos. As mudanças financeiras,
culturais e políticas ocorridas nos Estados Unidos abalaram
a estabilidade, a autoridade e o conjunto da mídia americana.
O surgimento de estrelas-jornalistas de TV tem oferecido recompensas
consideráveis aos profissionais de imprensa desde que
esqueçam o real significado da palavra repórter.
Isso
possibilitou o aumento da interferência de políticos
e assessores, com o objetivo de plantar rumores ou notícias
na imprensa. "A luta por mais leitores nas redações
de jornais e a luta por maiores índices de audiência
nas TVs estão transformando editores em gerentes e aumentando
a flexibilidade dos repórteres, bem como a sua vendabilidade.
Esses conceitos são considerados normais na maioria dos
negócios, mas podem pressionar de modo errado escolas,
unidades militares ou organizações jornalísticas.
Essas mudanças são importantes para o público
americano, pois elas enfraqueceram a habilidade da mídia
de nos dizer o que precisamos saber". [3]
De
acordo com estudo da Advanced Media Group, 80% dos jornais
americanos comercializam alguma forma de conteúdo on-line.
Segundo a pesquisa, mais de um terço dos jornais do país
está buscando novas maneiras de gerar receitas por meio
da venda de conteúdo na Internet, enquanto 8% já
definiram estratégias para aumentar a comercialização
de conteúdo on-line para 2002. As receitas adicionais
devem surgir da venda de fotografias ou de reportagens mais
aprofundadas - apenas 4% dos jornais americanos oferecem esse
tipo de material na Web. Um dado curioso: a maior parte das
empresas jornalísticas comercializa apenas artigos arquivados,
sendo que cerca de 95% cobram uma média de US$ 2 por
artigo visualizado. Mais de 60% das empresas que vendem reportagens
arquivadas estão faturando menos de US$ 500 por mês.
Uma
outra pesquisa feita pela Markle Foundation apontou que
70% dos internautas americanos questionam a maior parte do conteúdo
que lêem ou experimentam on-line. Apenas 23% confiam em
praticamente todo o conteúdo a que têm acesso na
Web. Ainda conforme um dos itens do estudo, a Web ainda é
vista como uma ferramenta de pesquisas, pois 45% dos entrevistados
associaram a rede mundial de computadores com uma biblioteca.
A situação instável e delicada dos jornais
também ficou evidente na Europa, onde o estudo da Associação
Mundial de Jornais (WAN) indicou que entre 1999 e 2000, Portugal
foi dos países que menos cresceu na leitura de jornais
diários.
Em 2000, para cada mil portugueses, 82,7 liam jornais diários,
números distantes por exemplo, da Noruega, onde há
719,7 leitores por mil habitantes; do Japão, com 668,7
leitores por mil habitantes; e até mesmo da Espanha onde
há 129,4 leitores de jornais diários por cada
mil habitantes. No entanto, conforme a pesquisa, a situação
em Portugal inverte-se quando se trata de jornais não-diários,
onde ficou registrado 138,8 leitores por cada mil habitantes,
continuando a ser um dos países europeus com mais leitores
de jornais não-diários à frente do Reino
Unido e da Suíça.
O
diretor do Observatório da Comunicação
(Obercom), Rui Cádima - baseando-se nas estimativas da
Associação Portuguesa de Imprensa - lembra que
nos últimos 30 anos, surgiram muitos títulos de
perfil semanal que habituaram o público português
à leitura não-diária, e ao mesmo tempo
foram desaparecendo muitos títulos diários significativos
como O Século, Diário Popular e Diário
de Lisboa. Cádima acredita que a penetração
da imprensa vai aumentar em Portugal.
Ele
vê com otimismo a mudança positiva na leitura de
jornais diários para esta década, principalmente
diante dos projetos visando a recuperação da taxa
de analfabetismo, o reforço da escolaridade obrigatória
e o desenvolvimento do setor educativo.
Diário Popular
No desenvolvimento de nosso trabalho procuramos mostrar os mais
diferentes aspectos que envolveram não apenas o jornalismo
em si, mas alguns dos principais veículos impressos do
país. E diante disso, decidimos escolher o Diário
Popular como o tema central de nossa pesquisa. Trata-se
de um jornal que fez sua história, tomou parte da própria
história do Brasil e esteve presente em vários
momentos importantes nos setores social, político e econômico.
O Dipo como era carinhosamente conhecido foi impresso e distribuído
pela primeira vez no dia 8 de novembro de 1884.
Seus
fundadores José Maria Lisboa e seu amigo Américo
Campos estabeleceram desde o início os objetivos e as
metas de comportamento que seriam adotadas pelo jornal. E foi
a partir do primeiro número que o Dipo abraçou
a causa da Abolição da Escravatura e, em seguida,
a da República. Com uma mentalidade progressista, o jornal
soube desde o começo o caminho para superar os problemas
e seus oposicionistas. Em sua linha editorial destacava-se a
preocupação pela solidariedade e a manutenção
da liberdade de expressão e pensamento.
A
cada fase marcante da história do país, o Diário
Popular também evoluía em todos os sentidos,
adquirindo equipamentos, amplas instalações e
mão-de-obra especializada, principalmente no meio literário.
Das
instalações modestas da rua João Brícola
- no centro velho de São Paulo - com uma passagem significativa
pela rua do Carmo, até o tradicional prédio da
rua Major Quedinho adquirido na década de 70, foi uma
longa trajetória.
Durante
um século o Dipo evoluiu, mas como sua própria
direção dizia: sempre sendo fiel a seus princípios.
Com o slogan de "o jornal de todas as classes", o
Diário Popular mostrou nas décadas de 60
e 70 uma linha editorial sóbria, cujo objetivo eram as
classes B e C, tornou-se conhecido também por suas páginas
de classificados publicadas às quintas-feiras e aos domingos.
Embora não competindo editorialmente com a Folha de
S.Paulo e O Estado de S.Paulo, o velho Dipo conseguia
manter um público fiel, oferecendo um noticiário
objetivo e eficiente. Mesmo atravessando algumas adversidades,
o Diário Popular mostrou-se resistente às mudanças
tecnológicas.
Enquanto
seus concorrentes se aparelhavam com máquinas e equipamentos
modernos, o jornal da Major Quedinho mantinha suas máquinas
de linotipo a todo vapor. Todavia, as mudanças forçosamente
ocorreriam na década de 80. O jornal não suportava
mais competir em desvantagem, acima de tudo com a agilidade
e o dinamismo dos concorrentes cujas edições chegavam
cada vez mais cedo às bancas da Capital e Interior. No
final dos anos 80, a família Lisboa deixava o comando
do jornal. Diário Popular e o Popular da Tarde
(jornal especializado em esportes criado na década de
70) iriam sofrer profundas modificações no comando
do diretor Ari Carvalho - sócio do ex-governador Orestes
Quércia - que confiou as mudanças gráficas
e editoriais ao experiente jornalista Miranda Jordão.
A
linotipia fazia parte do passado. O Popular da Tarde
transformou-se no Caderno de Esportes do Diário Popular,
que por sua vez, apresentou aos seus leitores um noticiário
renovado, com ênfase às editorias de Polícia,
Geral e Esportes. O objetivo: aumentar a vendagem, atingir principalmente
as classes B,C e D, e transformar o Dipo em O Rei das Bancas.
A nova fase foi recompensada com a aceitação total
por parte dos leitores. O jornal passou a atingir recordes nas
vendas e obtendo um espaço considerável num mercado
que até então era dividido com A Folha da Tarde
e o Noticias Populares. A partir da informatização
o Dipo ganhou fôlego e não demorou muito, já
sob o comando de Orestes Quércia, para o jornal sofrer
uma nova exigência de mercado. Ou seja, transformar-se
graficamente, ganhando novas cores. Havia receio de que os leitores
não aceitariam essa mudança.
Algumas
pesquisas inclusive apontavam a preferência do público
pelo edição em branco e preto. Mas, a ousadia
empresarial acabou prevalecendo, renovando o velho Dipo, tornando-o
mais competitivo. O Diário Popular durante mais
de um século sempre foi apontado como a grande escola
para os jornalistas que iniciavam na profissão. Grandes
nomes passaram pela redação não só
da rua do Carmo como também da Major Quedinho. A inegável
empatia com o público fazia do Dipo um fenômeno.
Afinal como pôde um jornal sobreviver a tantas mudanças
? Que tipo de atração mantinha o leitor fiel ao
jornal?
Consideramos
que a linha discreta mantida pelo veículo seguramente
conquistou o público. Na verdade, o sensacionalismo nas
páginas esportivas e policiais eram oferecidas de uma
forma menos agressiva do que os concorrentes. Havia , sim, a
credibilidade por parte do público em cada matéria
publicada. Na produção editorial havia muito do
jornalismo dos anos 50 e 60, porém, envolvido em uma
camada de modernismo que prendia o leitor nas principais reportagens
investigativas.
Contudo,
o tempo também foi implacável com o Diário
Popular que acabou sucumbindo às exigências
da modernidade. Uma nova feição, já sem
o comando de Miranda Jordão, passou a tomar conta do
Dipo em meados dos anos 90. Como todos os seus concorrentes
o jornal da Major Quedinho rendeu-se a nova ditadura do mercado.
Sob forte pressão política e econômica,
a linha editorial passou a ser mais flexível. Da mesma
forma como o Dipo foi considerado "o último dos
moicanos" a entrar na era da informática, o mesmo
procedimento ocorreu em relação a "semanalização"
ou como queiram a "cadernalização" que
tomou conta de todos os veículos impressos diários.
Novas editorias foram criadas,como por exemplo a do Consumidor,
Informática e Recursos Humanos, forçando a "cadernalização"
de outras tradicionais, como a de Economia, Geral, Turismo e
Variedades.
Nessa
nova fase de mudanças, além dos cadernos, o jornal
ganhou também uma outra reforma gráfica. O tradição
do jornal em preto e branco foi abandonada. Apesar da impressão
em cores e das novidades em termos editoriais, a força
dos cadernos de Polícia e Esportes foi mantida, como
também a preferência dos leitores. Sob nova diretoria
de redação, o Dipo passou a fazer parte também
da distribuição de prêmios, entre os quais,
ingressos de teatro, vídeos, CD's, etc. Aos finais de
semana, as matérias "frias" ou especiais, foram
ganhando a preferência e ocupando espaços cada
vez maiores nas páginas internas e integrando as manchetes
principais da primeira página.
Por
fim, o jornal atingiu uma mesma padronização de
mercado, com notícias semelhantes não-aprofundadas
em seu dia-a-dia, e optando por matérias comportamentais
e de serviços, aos domingos. Tornou-se um jornal igual
aos concorrentes, diferenciando apenas num acentuado noticiário
policial e esportivo. A preferência dos leitores e a tradição
não foram suficientes para impedir uma negociação
que determinaria o seu posterior "desaparecimento"
do mercado. Os fatores político e econômico novamente
foram decisivos e compatíveis com os anseios da Organização
Globo de contar com um jornal diário de grande penetração
em São Paulo.
Em
setembro de 2001, o velho Dipo saía de circulação
para a entrada do "novo" Diário de S.Paulo.
Décadas de 30 a 50
Com um visual gráfico pouco atraente, o Diário
Popular destacava seu título na primeira página
em letras góticas, a exemplo do jornal norte-americano
New York Times. Na década de 30, os jornais não
absorviam um trabalho mais intenso em termos de arte. Por isso,
as primeiras páginas carregavam nos textos, explorando
muito pouco a imagem. É evidente que a tecnologia também
não ajudava. Mesmo com equipamentos de ponta, para a
época, o Diário, por exemplo, procurava
concentrar o noticiário principal na primeira página,
acompanhado da manchete. Os resultados finais da composição
e impressão eram modestos já que as fotos e ilustrações
não atingiam uma reprodução satisfatória.
Mas,
o jornal atendia às necessidades de seus leitores. Os
recursos tecnológicos eram bem diferentes, porém,
o trabalho artesanal feito na redação superava
qualquer dificuldade. Escolhemos alguns exemplares do Diário
Popular que oferecem uma dimensão exata do noticiário
da época.
Em
julho de 1932, o Dipo estampava como manchete principal a luta
pela Constituição, dando na primeira página
o texto da matéria, com retrancas, e apenas três
fotos com personagens principais do assunto em foco.
Na
sua trajetória, o Dipo colecionou fatos históricos.
Ou seja, cumpriu seu dever como veículo de informação.
Em 1939, estampou na primeira página o início
da Segunda Guerra Mundial. É evidente que a notícia
por si mesma carregava um impacto muito grande. O mesmo aconteceu
com a rendição da Alemanha na edição
de 7 de maio de 1945. Neste número, houve um trabalho
mais apurado. A primeira página foi elaborada com equilíbrio.
Os textos foram ocupando os espaços intercalados pelas
fotos e ilustrações dos personagens principais
da guerra. É preciso lembrar que esse tipo de trabalho
dependia exclusivamente do material das agências de notícias.
Mesmo assim havia a preocupação de cuidar e atender
aos anseios dos fiéis leitores, acima de tudo tornando
a página, em sua grande parte ocupada de textos, mais
"suave" possível.
No
período que mencionamos, embora houvesse uma atenção
para com os textos, notamos que não havia uma ordem natural
a ser seguida. Ou seja, a diagramação era feita
segundo critérios adotados no fechamento da edição,
sem haver uma programação preestabelecida. Alguns
pequenos anúncios, timidamente começavam a ocupar
espaços na primeira página. Os "brancos"
da página eram preenchidos com os famosos "calhaus"
ou notícias de "última hora". Observamos
que a função da primeira página era a de
estampar a matéria principal, com manchete e os textos
completos da respectiva cobertura.
Com
um visual bem mais moderado a edição de 6 de novembro
de 1946 destacou na primeira página a destruição
parcial da Estação da Luz, em razão de
um incêndio no setor administrativo. Além do título
principal, e subtítulos, quatro fotos ampliadas em seqüência,
ocuparam meia página mostrando os ângulos principais
do fato. O texto, logo abaixo da fotos, contava o desenrolar
dos acontecimentos, e ao lado, um edital da São Paulo
Railway Company, orientando os passageiros para o embarque e
desembarque.
As
edições extras e comemorativas também faziam
parte da história do Diário Popular. No dia 25
de janeiro de 1954 o destaque ficou por conta dos festejos comemorativos
do IV Centenário de São Paulo. Na capa, o jornal
apresentou uma ilustração ampliada e textos do
acontecimento.
Com
uma linguagem jornalística bem característica,
o velho Dipo contou em detalhes os momentos que antecederam
o suicídio do presidente Getúlio Vargas, em agosto
de 1954. Várias fotos distribuídas, sem uma programação
aparente, acompanhavam na primeira página da edição
extra o texto principal da matéria cujo trabalho informativo
era complementado com retrancas que abordavam as repercussões.
É evidente que, diante dos parcos recursos da época,
os esforços editoriais tinham de se concentrar na preparação
da primeira página, que tinha a incumbência de
atrair os leitores.
Décadas de 60 a 80
As
transformações políticas e econômicas
passaram a ocupar as manchetes dos principais jornais do País.
O Diário Popular, integrado também a um
novo projeto visual, acompanhou os momentos principais desde
a instalação dos três poderes em Brasília,
a renúncia de Jânio Quadros e o início de
um período de 20 anos de ditadura militar. Na primeira
página, as fotos sobressaíam aos textos com a
clara intenção de atrair um número cada
vez maior de leitores. Já nessa época, as formas
de trabalhar a primeira página eram bem melhores. Os
recursos permitiam o uso mais intenso da imagem, trabalhando-a
de uma maneira apropriada.
Todavia,
os textos ainda eram "pesados" não permitindo
uma maior criatividade na página principal. Além
do momento de transição na área política,
o Dipo registrou de uma forma ainda conservadora alguns acontecimentos
importantes como a conquista da Copa do Mundo de 62 e o assassinato
do presidente John Kennedy, em novembro de 1963.
A
partir de 1967, o Dipo já apresentava aos seus leitores
uma nova "cara". Com uma aparência mais leve,
o jornal procurava diversificar seu noticiário na página
principal. Notava-se uma nova "hierarquia" sobre a
colocação das matérias na página.
Sem dúvida, a manchete principal, ganhava seu espaço
com direito a fotos, textos e pequenas chamadas complementares.
Num segundo escalão, surgiam as submanchetes, ou seja,
as matérias que mereciam uma chamada na primeira página,
sem muito destaque. O primeiro transplante feito pelo professor
Zerbini, o novo Ato Institucional, a chegada do homem à
lua, foram algumas das matérias que marcaram a década
de 60. Foram elas, também, que mereceram um tratamento
especial de primeira página.
Conseqüentemente,
monopolizaram a respectiva edição com farto material
de textos e fotografias. A presença de um censor nas
redações, mexeu com o brio dos profissionais de
imprensa. No Dipo essa figura do censor foi desempenhada por
um general da reserva. Por ele, passariam todas as provas das
matérias que iriam para a composição e
impressão respectivamente. Os desmandos do militarismo
não eram estampados nas primeiras páginas e, muito
menos, no miolo do jornal. Em novembro de 1969, ganhou destaque
na primeira página do Diário Popular, a
morte, em tiroteio, de Carlos Marighela, apontado como o mentor
intelectual do terrorismo em todo o Brasil. Na verdade, o Dipo
não era determinado em sua linha editorial.
Alegando
uma boa aceitação em suas páginas de classificados,
o jornal era moderado em sua posição política,
e também, quanto ao trabalho das matérias para
a publicação. O general comandava as ações.
E a direção do jornal concordava plenamente. Entretanto,
o Diário Popular era apontado como uma verdadeira
escola para o jornalismo. Apesar de um perfil modesto, a "casa"
oferecia um ambiente satisfatório no desenvolvimento
das funções jornalísticas. Isso contribuía
sempre para o surgimento de novos e bons profissionais.
O
velho Dipo mostrava uma certa versatilidade em lidar com as
transições urgentes quanto ao aspecto editorial.
E foi desse jeito, que o jornal começou a ganhar uma
nova forma no início da década de 70. A festa
do Tricampeonato mundial de futebol, no México, monopolizou
a primeira página, onde fotos e textos alternavam-se
passando ao leitor a cobertura completa da grande conquista.
Da mesma forma, o Diário se conduziu ao relatar a tragédia
do Edifício Andraus. As imagens nesse episódio,
ganharam uma conotação especial, acima de tudo
pelo bom trabalho fotográfico.
Os
textos foram colocados de uma forma quantitativamente equilibrada.
Em
meados da década de 70, o Dipo já deixava bem
claro a preferência em trabalhar melhor as imagens, ficando
para os textos apenas uma função de complemento.
Embora com boas ampliações de fotos na primeira
página, o jornal não perdia sua característica
editorial.
Ou
seja, de manter seu noticiário estritamente informativo.
Nas primeiras páginas, havia sempre uma colocação,
discreta que fosse, sobre as ações dos militares,
porém, a morte de um terrorista nacional ou internacional
era sempre garantia de um bom espaço. No início
da década de 80, a empresa Diário Popular S/A
já mostrava alguns sinais de preocupação
de ordem econômica. Algumas edições foram
marcantes no aspecto político. Como por exemplo, a do
atentado ao Papa João Paulo II, Diretas Já, e
o conseqüente fim da ditadura militar.
Nesse
período, o velho Dipo contava com o respaldo do Popular
da Tarde, especializado em esportes. Depois da edição
comemorativa de 100 anos, em novembro de 1984, o Diário
novamente se fez presente em uma das páginas históricas
do País, dando ampla cobertura à morte de Tancredo
Neves. Com um designer elaborado especialmente para a edição,
o velho Dipo abandonou o padrão conservador a fim de
se integrar também ao emocional do povo brasileiro. Com
fim da ditadura militar e uma crise econômica preocupante,
chegava ao fim a dinastia da família Lisboa, entrando
em ação, uma nova filosofia empresarial tendo
como pano de fundo, o ex-governador Orestes Quércia.
Em
novembro de 1988, a diretoria de redação decidiu
transformar o conservador e moderado Dipo num jornal popular
e mais arrojado. Sim, popular sem ser vulgar. A idéia
foi torná-lo um veículo com a cara do povo, aproveitando
um vácuo na faixa de mercado dos considerados jornais
populares. O Dipo então se apresentou com nova roupagem
e disposto a conquistar os leitores, principalmente, concentrando
as atenções nas editorias de Polícia e
Geral, e lapidando ainda o Caderno de Esportes, que nada mais
era do que o antigo Popular da Tarde. Além disso,
um tópico importante na vida do velho Dipo. Finalmente,
a informatização chegara à redação.
Novos recursos, tecnologia de ponta, era o oxigênio que
faltava ao tradicional veículo paulista para se consagrar.
Décadas de 90 a 2000
Essa
nova fase do Diário Popular, já informatizado
e integrado às novidades tecnológicas de mercado,
permitia ao jornal uma aceitação muito grande
por parte dos leitores. O que lhe valeu o slogan de "O
Rei das Bancas". Com um noticiário atraente tendo
como carro-chefe as editorias de Polícia e Esportes,
o Dipo foi deixando para trás seus mais diretos concorrentes
a Folha da Tarde e Notícias Populares.
Os dois jornais - pertencentes ao Grupo Folhas - já não
circulam mais e seus profissionais estão integrados à
redação do jornal Agora, que substituiu
a Folha da Tarde.
Com
a faixa de mercado muito mais livre, o Diário
tentava a cada exemplar um visual diferente para sua primeira
página, com uma dose de sensacionalismo nos títulos,
mas com arrojo nas aberturas das fotos. A marca principal das
manchetes do Dipo era a atualidade. Ou seja, a notícia
quente trabalhada a todo custo por sua equipe de reportagem,
que saía às ruas sempre em busca do inédito,
inesperado, curioso, algo que certamente iria satisfazer o leitor
sedento por informações de impacto.
Nesse
período, precisamente nos anos de 1992 e 1993, houve
um crescimento acentuado do jornal em vendas avulsas. Em maio
de 1994, quatro anos após a filiação ao
IVC, a circulação líquida paga do jornal
registrava um aumento de 96% em relação a 1990.
Em 1995, uma pesquisa aponta o Diário Popular
como o segundo jornal mais lido na Grande São Paulo,
de segunda-feira a sábado. Na pesquisa da Marplan Brasil,
feita em 1995, o Dipo na média diária de leitores
de terça a sábado, possui 484 mil leitores, contra
452 mil da Folha de S.Paulo e 409 mil de O Estado
de S.Paulo. No entanto, uma nova mudança na diretoria
de redação, conduziria o jornal para um outro
caminho, um pouco mais distante de seu fiel leitor.
O
preto e branco tradicional do jornal diário, passava
a incomodar a estrutura moderna do veículo. Além
disso, o jornal lentamente foi perdendo a característica
do ineditismo. Ou melhor, foi se "desvirtuando" até
tornar-se, editorialmente, um jornal igual aos seus concorrentes.
Em julho de 1998, o Diário se apresentava nas
bancas de "roupa e cara novas". A edição
em cores procurava oferecer aos leitores algo mais moderno e
dinâmico. Mais investimentos foram feitos na reforma gráfica
do jornal para dar à primeira página um pouco
mais de sofisticação.
O
sistema implantado na linha editorial, que até então
obtivera ótimos resultados, foi aos poucos sendo abandonado.
O Dipo, a exemplo dos seus concorrentes, estava se transformando.
Mudando por fora e por dentro. Além das tradicionais
editorias, foram criados alguns cadernos para assuntos específicos,
como imóveis, consumidor, isto sem falar no grande volume
de prêmios e brindes oferecidos nas edições
de domingo.
Dessa
forma, entendemos, que perdia o dinamismo da notícia,
mas ganhava a filosofia empresarial com alternativas de lucros.
A
nova embalagem, mais atraente, não é e nunca foi
sinônimo de qualidade. As cores não chegaram a
atrair ou satisfazer os interesses dos leitores fiéis
ao Diário Popular. Mas a modernização
acabou por levar o Dipo às manchetes e matérias
"frias" dos finais de semana. Por orientação
dos editores executivos, os repórteres, além do
dia-a-dia tradicional, tinham de buscar assuntos para as chamadas
"matérias especiais". E assim o Dipo começava
sua fase de "cadernalização" ao mesmo
tempo em que desenvolvia suas matérias "frias"
dos domingos.
Esta
"semanalização" mudava o perfil do Diário
Popular, definitivamente.
As
manchetes principais, nos finais de semana, destacavam assuntos
muito próximos ao estilo das revistas de informação
geral. É evidente que tal "semanalização"
vem apoiada no argumento de que existe nos jornais modernos
todo um processo industrial, e também uma pressão
político-econômica, que exige dos veículos
uma chegada antecipada às bancas.
Isso
leva a uma antecipação das edições
dominicais, acarretando assim, a elaboração de
matérias comportamentais ou de interesse humano. Isso
caracteriza a "semanalização", ou seja,
uma possível concorrência com as revistas de informação
geral - Veja, Isto É e Época. Ficou
bem característico no novo Dipo a inclusão no
alto da primeira página de um anúncio dos prêmios
e brindes, acompanhado quase sempre de um "calhau"
da revista Já, também editada pelo Diário,
com chamadas das matérias principais. Evidentemente,
nada de novo era apresentado pelo jornal, a não ser uma
cópia quase fiel do que faziam seus concorrentes.
Com
uma primeira página congestionada com chamadas e anúncios,
o Diário ainda continuava como o preferido dos leitores
na faixa popular.
Porém,
o golpe de misericórdia foi dado por intermédio
de interesses empresariais. A compra do Diário Popular
pela Globo determinou o fim de uma tradição
nas bancas de jornais de São Paulo. No dia 22 de setembro
de 2001, num sábado, circulou a última edição
do velho Dipo. Para trás ficou toda uma história
dentro do jornalismo. Um rápido percurso marcou a caminhada
do jornalismo nostálgico à fase modernista. No
domingo surgiu nas bancas um "velho" conhecido dos
jornalistas mais antigos, mas com uma nova roupagem, uma nova
filosofia, sem elo algum com o jornalismo praticado nos anos
50 e 60. Nas bancas, o Diário de S.Paulo, que
lembra apenas no nome o jornal que integrava a rede de comunicação
de Assis Chateaubriand.
Considerações finais
O
jornalismo passa por um momento delicado, de transição,
de indefinição por parte dos veículos que
integram a área de comunicação. A proposta
de nosso trabalho, em concentrar estudos sobre o jornal diário,
especificamente o Diário Popular, teve como objetivo
mostrar as diferentes fases que um veículo impresso passou
e tem de passar no transcorrer dos anos. Não se trata
de estabelecer regras, definir metas para o futuro do jornal
diário, mas sim, detectar e analisar as adversidades
enfrentadas, tendo como perspectiva uma possível mudança
em seu processo.
Consideramos
de fundamental importância, antes de entrarmos no objeto
de nosso trabalho, ter apresentado um relato histórico
sobre a chegada e o desenvolvimento do jornalismo em nosso País.
Além da evolução dos jornais que se transformaram
mais tarde em grandes conglomerados de comunicação,
as pesquisas também ressaltaram períodos históricos
com o rádio e a televisão que marcaram transformações
de ordem política e econômica, e até mesmo
dos costumes sociais em diferentes épocas.
Desde
o início, o jornalismo foi pautado por intermédio
de conceitos que direcionaram seu desenvolvimento para cada
um dos veículos de comunicação. Tais conceitos
também tiveram de ser analisados, principalmente, centralizando
alguns ítens importantes relacionados às características
do próprio jornalismo que abrangem, ética, responsabilidade
social, veracidade, objetividade, honestidade e, acima de tudo,
o maior patrimônio da categoria, a credibilidade.
Mas,
a história do jornal impresso vai mais além. Ou
seja, discute-se até hoje o futuro desse veículo,
tendo como pano de fundo as novas mídias impostas pela
tecnologia moderna. Basta lembrar que o jornal passou pelo desafio
do rádio, pela competição direta da televisão
e, no momento, pela invasão esmagadora da internet. Antes
de mais nada, é importante refletir sobre a capacidade
extraordinária que o veículo impresso diário
tem de se ajustar às exigências de mercado. Aconteceu
dessa forma com a chegada do radio, que prometia e cumpria um
imediatismo a toda prova.
No
entanto, isso não foi suficiente para barrar a evolução
do jornal, que seguia em frente, com novos ajustes editoriais.
Mais tarde, ocorreu o mesmo fenômeno com a televisão,
que não conseguiu dobrar o jornal, e mais ainda, teve
de aprender a conviver com o "inimigo", introduzindo
um processo de pauta baseado nas atividades do impresso diário.
O
jornal impresso enfrentou a todos os desafios, com determinação,
e soube se adequar a cada período de transformação.
Embora determinado no ato de informar ao público, o jornal
diário sofreu o impacto provocado pela informatização,
mais precisamente, por parte da internet, que busca incessantemente
conquistar uma considerável faixa de mercado, ainda sob
o domínio do veículo impresso. O fenômeno
da internet causou uma agitação natural no mercado
e previsões pessimistas quanto ao futuro do jornal. Todavia,
registramos por outro lado, que o impacto causado pela internet
foi passageiro. O jornalismo está, sim, atravessando
um período de estagnação, e possíveis
mudanças em seu perfil, porém, sem qualquer vínculo
que possa ser atribuído apenas à internet.
O
enfoque sobre o Diário Popular procurou mostrar,
além das mudanças radicais, a estrutura forte
de um veículo impresso para suportar as pressões
de setores políticos e econômicos. O Dipo alternou
bons e maus momentos em seus longos anos de vida, e soube como
se adaptar, se ajustar, aos desmandos implantados por sua direção.
O jornal diário é versátil por natureza
e pode conservar por muito tempo um público fiel, mas
exigente com relação às mudanças
editoriais. O Dipo, digamos assim, acompanhou a modernidade,
a evolução de seus concorrentes diretos e indiretos.
Mas pagou um preço alto, não pelo produto - a
notícia - que colocava no mercado, mas pelos interesses
e indefinições de seu comando empresarial e político.
O
próprio jornalismo nos apresenta grandes surpresas e
contradições. Ao mesmo tempo em que nos deparamos
com o final do ciclo de vários jornais - no passado,
alguns tradicionalíssimos - como a Folha da Tarde,
Gazeta Esportiva e Notícias Populares,
e o enfraquecimento de outros como Gazeta Mercantil e
Jornal da Tarde, constatamos um fato curioso: o velho
Dipo deixou de circular no "auge da carreira". Tais
mudanças, inexplicáveis dentro de alguns conceitos
editoriais, demonstram uma força incomparável
do veículo impresso. Basta lembrar que o imediatismo
"exagerado" da notícia veiculada pelo rádio,
televisão e internet, não conseguiu superar a
informação bem trabalhada, checada e apurada,
que o jornal pode e deve oferecer ao leitor, considerado o verdadeiro
patrão dos impressos.
Nossos
estudos observaram que as transformações ocorridas
no Diário Popular, obedeceram uma ordem cronológica,
a começar pelo linotipo, impressão offset, informatização
e, conseqüentemente, a "caderna-lização"
ou "semanalização" de seus componentes
editoriais. Uma exigência do mercado ou não, o
certo é que o próprio Dipo caminhou para o fim
ao tentar se modernizar. O diferencial de um veículo
impresso está na qualidade da notícia que apresenta,
e não em apresentar uma embalagem atraente, mas com um
produto de origem duvidosa.
Quando
nos referimos a um período de transição
que o jornalismo atravessa, procuramos nos concentrar nos veículos
impressos, ressaltando a semelhança que vêm oferecendo
em termos de mercado.
Pelo
menos no momento, houve um desaparecimento do jornalismo ousado,
corajoso, impetuoso no seu jeito de ser, de buscar as informações,
oferecendo ao público uma narrativa fiel dos fatos. O
Dipo sucumbiu exatamente quando abandonou essas características,
para se tornar um veículo moderno, semelhante aos seus
concorrentes, deixando órfãos seus fiéis
leitores. Uma das lições que aprendemos no jornalismo:
jamais subestimar o leitor.
É
possível que esteja aí o grande impulso que faltava
à mídia eletrônica para arrebatar o nicho
de mercado dos veículos impressos.
Entendemos
que os jornais necessitam buscar algo novo, inédito,
exatamente para escapar desse marasmo prejudicial ao próprio
sistema jornalístico. Semanalizar e concorrer com as
revistas de informação geral, não acreditamos
ser um caminho acertado, isto pelas diferenças de estilo
no aspecto editorial, e quanto a embalagem, no acabamento gráfico.
Nosso
trabalho procurou demonstrar que na transformação
do Diário Popular para o Diário de S.Paulo,
o velho Dipo deixou saudades de um jornalismo envolvente. Seus
leitores, como testemunharam alguns profissionais, ainda estão
à procura do Dipo pelas bancas da cidade.
Afinal,
ele era parte integrante do cafezinho fresco e o tradicional
pão com manteiga de todas as manhãs. A mídia
eletrônica não reúne ainda condições
de suplantar a mídia impressa ao ponto de fazer esta
última desaparecer completamente do cenário. O
jornal diário continua vivo, mas desconhecendo o potencial
que poderia torná-lo mais vibrante e afastar de vez as
pretensões dos veículos eletrônicos. Não
basta saber, conhecer a notícia, é preciso sim,
entendê-la.
Nesse
aspecto, o jornal diário continua insuperável.
Mas é preciso que os impressos, além de se modernizarem,
façam uma auto-análise a fim de diagnosticarem
quais os problemas que prejudicam o processo evolutivo em sua
linha editorial. Os fatos, os acontecimentos, ocorrem a cada
instante. O fundamental é saber como tratá-los
e transmiti-los ao público. E o jornal impresso possui
uma larga experiência a respeito. A modernidade faz uma
exigência: não basta ser igual, é preciso
ser diferente.
Referências
Bibliográficas
[1]
DINES, Alberto. O Papel do Jornal: uma releitura. SP: Summus,
1986. (p. 47-48).
[2]
FALLOWS, James. Detonando a Notícia: como a mídia
corrói a democracia americana. Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1997. (p. 88).
[3]
Idem (p. 92 ).
*Laercio
Arruda é jornalista.
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