Monografias
Crítica
ao desconstrucionismo
da objetividade jornalística
Por
Éverton
Miguel*
Resumo:
O
principal objetivo deste artigo é a defesa da Objetividade
Jornalística como técnica mais eficiente
na construção do texto jornalístico.
Constatou-se, nas quinze Universidades pesquisadas, que
nas bibliografias recomendadas da disciplina "Teoria
do Jornalismo" - Perseu Abramo, Fernando Correia,
Barros Filho, Cláudio Abramo, Traquina, Genro Filho,
Nilson Lage, Eduardo Meditsch - a maioria dos autores
desconstrói a epistemologia da Objetividade Jornalística.
A metodologia [1] empregada foi a revisão bibliográfica
de trabalhos publicados pelos autores citados, analisando,
discutindo e criticando as idéias contidas nesses
estudos. O artigo justifica-se por entendermos que é
inaceitável a afirmação de que "não
existe objetividade em jornalismo" e que a visão
marxista dos autores em nada contribui para o aperfeiçoamento
da técnica da objetividade.
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Reprodução

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Palavras-chave:
Objetividade
Jornalística; Desconstrucionismo; Crítica.
Pesquisa
organizada por Antonio Hohlfeldt, Professor de Teoria da Comunicação
no Programa de Pós-Graduação da FAMECOS-PUCRS
[2], investigou em vinte e uma publicações, entre
manuais de redação e livros de autores brasileiros,
norte-americanos e espanhóis, os principais critérios
utilizados na construção do texto jornalístico.
Esses critérios constituem o que se convencionou denominar
de categorias jornalísticas. Deste levantamento, a categoria
"objetividade" se coloca como a mais citada.
Todavia,
reconhece o organizador do estudo, a Objetividade Jornalística,
apesar de ser a mais referida, ao mesmo tempo, é crescentemente
contestada, relativizada em favor de outros conceitos, como
a imparcialidade e/ou a ética, chegando a ser negada
em alguns livros didáticos e em manuais de redação,
como o da Folha de São Paulo [3], que afirma categoricamente:
"não existe objetividade em jornalismo".
Desde
há muito a Objetividade Jornalística vem sendo
questionada, em particular, sobre a possibilidade dos jornalistas,
dos meios de comunicação, dos governos, das elites
em manipular a verdade e distorcer a realidade.
No
entanto, não é mencionado que dentro dos fundamentos
da Objetividade Jornalística existem mecanismos capazes
de controlar tais ímpetos, como a checagem das notícias,
passando a falsa impressão a leitores e estudantes de
que, ao se questionar a Objetividade, está se tomando
uma atitude de vanguarda, condicionando os novos jornalistas
a contestar de imediato o que vem dando certo no jornalismo.
Na
bibliografia pesquisada para este artigo, não foi localizada
com exatidão se essas contestações e questionamentos
nasceram no ambiente acadêmico ou nas redações
dos veículos de comunicação ou, talvez,
em ambas. O que se pode afirmar, analisando as ementas dos Cursos
de Jornalismo da UFSC, UNISUL, USP, UNICAMP, UFRGS, UFSM, UFPR
e outras oito Universidades particulares pesquisadas, é
que há uma proposição, orquestrada pelos
conselhos acadêmicos, para o questionamento da Objetividade
Jornalística dentro das Universidades.
A
afirmação baseia-se no fato de que os autores
recomendados por essas Universidades como bibliografia básica
para a ementa da disciplina "Teoria do Jornalismo"
- Perseu Abramo, Fernando Correia, Barros Filho, Cláudio
Abramo, Nelson Traquina, Adelmo Genro Filho, Nilson Lage, Eduardo
Meditsch - todos, em certa medida, mais ou menos contundentes,
criticam ou desconstroem as definições, conceitos,
postulados e métodos, ou seja, a epistemologia da Objetividade
Jornalística.
Exceção
a Michael Kunczik que define, de forma isenta e didática,
os Conceitos de Jornalismo e a Jay Rosen, que mesmo criticando,
apresenta soluções práticas e alternativas
para uma nova leitura da Objetividade.
Este
artigo não pretende mitificar a Objetividade Jornalística,
por entender que ela é um método, um formato ou
uma técnica, ou como queiram chamá-la, que pode
ser defendida ou contestada, elogiada ou criticada, que pode
e deve ser adaptada à realidade das redações
e até, por que não dizer, adaptada aos interesses
corporativos dos donos do negócio e também dos
jornalistas, porém jamais torná-la inexistente.
São
exageradas, inaceitáveis, incoerentes e perturbadoras
as afirmações de que Objetividade em Jornalismo
não existe, principalmente, ao se analisar os textos
dos autores que assim afirmam. Nota-se claramente que as críticas
estão fundamentadas num modelo Desconstrucionista, filosofia
ligada ao Marxismo, criada por Jacques Derrida e repercutida
por Michel Foucault, que preconiza que não existem fatos,
verdades, lógica, racionalidade, nem ciência, que
as palavras não têm significado; que não
há nada no mundo exceto um construto subjetivo dado pela
sociedade opressora.
Para
os desconstrucionistas, provas e não-provas não
importam. Eles aceitam axiomaticamente (sem demonstração)
que a estrutura do poder social controla tudo no mundo, incluindo
todas as narrativas, literatura e arte, vistas como reflexos
dos protestos contra tal poder e opressão.
Para
Carlos Reis [4], mestrado em História e Ciências
Políticas na UFRGS, "Derrida foi um dos principais
ícones das esquerdas. Morreu em 2004, por isso vem sendo
pranteado nas universidades e nas mídias, onde se cultua
a 'desconstrução' do pensamento, da cultura, do
logos".
Ironias
à parte, o fato é que, na França e nos
EUA, o Desconstrucionismo não é mais levado a
sério, visto à carga de incoerências que
carrega, a começar pela insistente afirmação
de que as palavras carecem de significado.
Segundo
Kovach & Rosenstiel (2003), existem certas idéias
duradouras no jornalismo que podem ser identificadas. Essas
idéias vão e voltam e têm sido mal compreendidas,
geralmente por aqueles que se dizem donos delas. Mesmo assim,
essas idéias não podem ser consideradas criações
artificiais.
Os
elementos do jornalismo foram forjados e temperados em trezentos
anos de experiência e testados no mercado das formas
competitivas de informação. Eles nascem da função
que as notícias exercem em nossas vidas. Aqueles que
produzem jornalismo devem usar esses elementos para conferir
um sentido ético ao seu trabalho. Se sairmos desse
caminho, será por nossa conta e risco.
Kovach
& Rosenstiel apóiam essas afirmações
sustentados em nove princípios minuciados em seu livro,
Os Elementos do Jornalismo. Se destacados os títulos
dos capítulos, que compõem os noves princípios,
praticamente são um tratado em defesa da Objetividade
Jornalística. No entanto, os autores abrem brechas para
suposições, o que coloca em dúvida se a
Objetividade é um método positivo ou negativo
para o jornalismo, propugnando um relativismo cognitivo entre
teoria e prática que, ao final, não chega a lugar
algum.
A
teoria do jornalismo consagra a definição clássica
de Schneider (1984), citado por Kunczik (2001), para Objetividade
Jornalística:
1)
Distingue entre opinião e notícia;
2)
Fica com os fatos, os quais:
3)
Não muda, não suprime e não publica "de
favor";
4)
Cada notícia deverá conter um mínimo de
equilíbrio.
Segundo
Kunczik (2001), a qualidade central dos procedimentos para se
alcançar a objetividade seria a revisão da verdade
das afirmações, mediante questionamento dos testemunhos.
Bentele (1982) in Kunczik (2001) enumera outros procedimentos:
1)
Informar sem emoções;
2)
Informar de modo desapaixonado;
3)
Selecionar palavras neutras para descrever o contexto;
4)
Empregar citações diretas;
5)
Citar fontes contraditórias;
6)
Observar evidências adicionais;
7)
Relatar na seqüência apropriada;
8)
Precisão, interesse, verificação, veracidade
e neutralidade.
Tuchman
in Correia (1997) enumera os seguintes procedimentos:
1)
A necessidade de ouvir as partes interessadas;
2)
A apresentação de provas auxiliares e fatos suplementares
que fundamentem o essencial da notícia;
3)
A utilização de citações entre aspas,
enquanto demonstração de que se ouviram as pessoas
e se lhes deu a palavra;
4)
A estruturação da notícia segundo a técnica
da pirâmide invertida, de modo a que o jornalista possa
argumentar, em abono da sua objetividade, que procurou chamar
atenção do leitor para o que era mais importante.
La
Roche in Kunczik (2001) oferece as seguintes normas para a representação
objetiva da realidade:
1)
Todos os fatos devem ser corretos;
2)
A informação duvidosa deve permanecer visível
como tal;
3)
À precisão correspondem interesse e equilíbrio;
4)
Não expressar as opiniões do autor;
5)
Evitar as expressões floreadas - adjetivos, advérbios,
etc;
6)
Identificar como tal a expressão de opinião dentro
da reportagem;
7)
Não acrescentar fatos ornamentais ou complementares.
Na
prática cotidiana do jornalismo, os EUA foram os primeiros
a adotar as definições, normas e procedimentos
da Objetividade Jornalística. Esta contribuiu decididamente
para a evolução do jornalismo, introduzindo a
figura do repórter, que passa a fazer cobertura "in
loco" dos acontecimentos, da técnica do "lead",
onde toda notícia deve informar, obrigatoriamente, quem
fez o quê, a quem, quando, onde, como, por quê e
para quê, e da pirâmide invertida, que destaca no
primeiro parágrafo os dados mais importantes e depois
os de menor importância.
Pode-se
incluir também a separação do noticiário
do editorial, notadamente nos jornais impressos. Segundo Rosen
in Traquina (2001), "a objetividade é uma das marcas
identificadoras do jornalismo nos EUA, e é talvez a maior
contribuição do jornalismo americano para o resto
do mundo".
A
pergunta imediata é: Se a Teoria do Jornalismo define
Objetividade e ela é entendida, assimilada e aplicada,
como podem afirmar que a Objetividade Jornalística não
existe?
A
resposta para essa questão inicia exatamente na tentativa
de alguns autores em desconstruir aquilo que a Objetividade
Jornalística mais contribuiu para com o jornalismo, ou
seja, o "lead". Adelmo Genro Filho [5] (1987), falecido
em 1988, professor da UFSC, marxista militante, não viu
a queda do muro de Berlin, a elevação do capitalismo
como ideologia hegemônica e dominante e o fenômeno
da globalização, ataca ferozmente a Objetividade
Jornalística, chamando-a de "Ideologia da Objetividade".
Para Genro Filho:
Não
há dúvida que a chamada "objetividade jornalística"
esconde uma ideologia, a ideologia burguesa, cuja função
é reproduzir e confirmar as relações
capitalistas. Essa objetividade implica uma compreensão
do mundo como um agregado de "fatos" prontos e acabados,
cuja existência, portanto, seria anterior a qualquer
forma de percepção e autônoma em relação
a qualquer ideologia ou concepção de mundo.
[...] O lead permite que através da natureza lógica
e abstrata da linguagem, constituída pela generalidade
intrínseca dos conceitos, seja retomado o percurso
que vai do abstrato ao concreto, não pela via da ciência,
mas pela reprodução do real como singular-significativo.
[...] Os fatos jornalísticos são um recorte
no fluxo contínuo, uma parte que, em certa medida,
é separada arbitrariamente do todo. Nessa medida, é
inevitável que os fatos sejam, em si mesmos, uma escolha.
Mas, para evitar o subjetivismo e o relativismo, é
importante agregar que essa escolha está delimitada
pela matéria objetiva, ou seja, por uma substância
histórica e socialmente constituída, independentemente
dos enfoques subjetivos e ideológicos em jogo. A verdade,
assim, é um processo de revelação e constituição
dessa substância.
Segundo
Mário Messagi Júnior [6], Doutorando em História
Social da UFPR, "Genro Filho constrói sua crítica,
incorrendo numa contradição, ao mesmo tempo em
que nega a objetividade, reafirma sua relação
com os fatos". Para entender toda a complexidade das ilações
de Genro Filho, seria necessário escrever um tratado
sobre Objetividade.
Mas,
a julgar e considerar somente pela ótica da epistemologia
da Objetividade Jornalística, se um jornalista adequadamente
treinado não tem a capacidade de descrever um fato como
ele aconteceu, o jornalismo não teria razão de
existir. Afinal, é isso que o público, o cidadão
espera dos jornais: ter contato com a realidade. O jornalismo
não é obra de ficção. Sem a objetividade,
seria difícil explicar o jornalismo a partir da relação
que público e profissionais estabelecem cotidianamente
entre si, isto é, tendo os fatos reais como objeto da
notícia.
Ademais,
as críticas de Genro Filho e as divagações
de outros autores marxistas, de certa forma, ao verbalizarem
suas teorias carregadas de preconceitos anticapitalistas, perderam
substância intelectual, já que o comunismo como
força política deixou de existir como ideologia
representativa e utópica, com a China adentrando mais
e mais no Mundo Capitalista, agregando para si os fundamentos
do mercado de capitais, e Cuba que aguarda passivamente a morte
de Fidel Castro para aliar-se aos EUA.
Atribui-se
à Objetividade Jornalística a responsabilidade
de não permitir ou vedar ao jornalista o direito à
opinião, o que não é verdade.
O
que a definição de Objetividade Jornalística
diz claramente é que opiniões e notícias
são composições distintas, que o contraditório
deve fazer parte da notícia com citações
diretas, que em caso de opinião do autor, a opinião
deve ser identificada como tal, que o jornalista deve relatar
os fatos com precisão, verificação, veracidade
e neutralidade.
Cláudio
Abramo (1988: 109,115) criticava essa postura de neutralidade,
dizendo que "o jornalista não pode ser despido de
opinião política. A posição que
considera o jornalista um ser separado da humanidade é
uma bobagem". Abramo (1988, 117) afirmava que "não
existe jornalismo objetivo. Isso é uma ilusão
que se tenta passar para os jornalistas e deve ser expurgada".
Abramo se contradiz nas páginas 35 e 37:
Introduzimos
no Estado um tipo de cobertura (protegida pela eficácia
operacional e pela precisão das previsões) absolutamente
neutra e totalmente distante dos editoriais do jornal. De
1956 a 1961 o Estado se tornou, talvez, um dos jornais mais
bem feitos do mundo. [...] Essa foi a grande reforma do Estado,
a maior reforma já feita num jornal brasileiro porque
mudou tudo e conseguiu manter, durante anos, um noticiário
o mais possível "objetivo", ao lado de editoriais
absolutamente antediluvianos.
Quer
dizer, para os outros, a Objetividade deve ser expurgada, mas,
por ele, a Objetividade Jornalística foi empregada, resultando
num sucesso pessoal e editorial. No entanto, Cláudio
Abramo é um exemplo para o jornalismo brasileiro. Prestou
uma grande contribuição à profissão,
exercitando uma autocrítica desprendida, sem preconceitos,
verificadas em seu livro "A Regra do Jogo".
Ao
afirmarem que é impossível desvincular a opinião
de uma narrativa objetiva, que não se pode tirar um fato
do contexto histórico e transformá-lo em notícia
sem que haja a interferência direta do observador naquele
momento, os desconstrucionistas recorrem a uma figura de retórica
da semiologia, onde alegam que a enunciação é
um fator decisivo no processo narrativo, que o sujeito da enunciação
é responsável pelo sentido, que nenhuma escrita
é inocente, gerando assim uma não-objetividade
dos textos jornalísticos. Tais alegações
caem por terra quando observada que a objetividade é
própria do procedimento científico e define a
possibilidade da verificação intersubjetiva.
Essa definição da objetividade pode aplicar-se
também ao jornalismo, o que quer dizer que deve ser abandonada
a noção freqüentemente discutida na literatura
de que a objetividade esteja ligada à relação
existente entre afirmação e realidade. Essa definição
faz da objetividade uma marca da investigação
e da informação profissional sempre e quando se
procura separar a notícia de comentário de modo
desapaixonado, imparcial e não-manipulador (KUNCZIK,
2001).
Em
entrevista ao Grupo de Pesquisas em Engenharia Biomédicas
[7], o jornalista Orlando Tambosi deixa mais claro essa questão,
ao responder a seguinte pergunta do GPEB - Em seus textos, o
Sr. argumenta que conceitos fundamentais à ciência,
como"realidade", "objetividade" e "verdade",
estão sendo hostilizados pela filosofia pós-moderna.
O que isso significa de fato e que riscos essa filosofia apresenta
para a pesquisa e o desenvolvimento científico?
Tambosi
- Esse modo de pensar, hoje tão comum em algumas áreas
das "ciências sociais" e humanidades, manifesta
ojeriza às ciências, propugnando um relativismo
cognitivo e cultural que não distingue o conhecimento
científico das fabulações mitológicas.
Nesse sentido, o "real", a "objetividade",
os "fatos", não passam de meras "construções
intelectuais". As ciências seriam apenas uma outra
forma de "narrativa".
Daí
certas vertentes radicais repetirem ad nauseam que a ciência
não só é ideológica, mas "branca",
"eurocêntrica", "machista", "heterossexual"
e assim por diante. Passa-se a privilegiar o intuitivo, o
mágico, o místico, o irracional. Esse pensamento
é regressivo, reacionário, obscurantista. Faz
as pessoas verem com desconfiança a pesquisa e o pensamento
científico, conformando-as às superstições
e as pseudociências. E, particularmente nas universidades,
difunde o ressentimento contra as ciências naturais.
Diante disso, repito sempre, não é de estranhar
que universidades de prestígio tragam ao Brasil sociólogos
delirantes como o francês Jean Baudrillard, que, a cada
três meses, vem nos advertir que "a realidade não
existe".
Segundo
Jay Rosen in Traquina (2003), a Objetividade não está
funcionando como antes, havendo, entre os jornalistas, uma confusão
em torno do termo. Um dos pontos abordados por Rosen é
que a Objetividade é um gênero de contrato entre
um grupo de profissionais, os jornalistas, e as pessoas que
lhes fornecem as instalações e o equipamento para
cumprir o seu trabalho.
O
contrato postula que "vocês editores, dão-nos
o direito de relatar as notícias de uma forma independente,
e em troca não causaremos demasiados incômodos
por introduzir a nossa política nas notícias".
Esse
contrato foi quebrado pelas corporações ao não
mais autorizar os jornalistas a sair e relatar notícias
de uma forma independente porque estão muito mais interessados
em reduzir custos e transformar as notícias num instrumento
de marketing. Então, pergunta-se: o que a Objetividade
tem a ver com esse contrato? Nada! A questão é
que os jornalistas se vêem como seres especiais e, segundo
Abramo (1988), não tem muita formação moral,
é fraco como todo ser humano, e não é muito
confiável.
O jornalista acredita que pode ser um gênero em si mesmo,
e quando não atendido seus interesses corporativistas,
acredita poder mudar as regras em que é estabelecida
a forma de lidar com a notícia. Por outro lado, a tendência
nos jornais é de haver uma relação de absoluta
subordinação e total conformidade dos jornalistas
com as normas, e não necessariamente com a linha do jornal.
Para
Abramo, os jornalistas não podem ter opinião,
mas os jornais têm suas opiniões sobre as coisas
e está ligada aos interesses daquela classe que pode
manter a grande imprensa. O
equívoco que existe entre os jornalistas é considerar
que essa grande imprensa possa ir além daquilo que é
seu papel histórico, e aí reside à origem
do conflito, pois os donos do negócio sempre irão
considerar a notícia como um produto vendável.
O
professor Perseu Abramo (2003), que não pode ser chamado
propriamente de liberal, apesar de criticar abertamente o que
ele chama de "falsa objetividade" da imprensa comercial
burguesa, colocando o jornalismo praticado pelo mercado como
um instrumento de controle político das elites, contrário
aos interesses maiores do povo brasileiro, ou seja, caindo nas
armadilhas do desconstrucionismo, afirma que é possível
fazer jornalismo com o máximo possível de objetividade.
"Mais ainda, é desejável fazê-lo porque
essa é a única forma de reduzir ao máximo
o erro involuntário e impedir a manipulação
deliberada da realidade". E
continua o professor Abramo:
O
reino da objetividade é a informação,
a notícia, a cobertura, a reportagem, a análise,
assim como o reino da tomada de posição era
a opinião, o comentário, o artigo, o editorial.
É fundamental separar e distinguir informação
de opinião, indicar as diferenças de conteúdo
e forma dos gêneros jornalísticos, e apresentar
toda a produção jornalística ao leitor/telespectador
de forma que ele perceba imediatamente o que é exposição
da realidade e o que é ajuizamento de valor.
A
Objetividade Jornalística é uma técnica
regida por normas e procedimentos e, por conseguinte, sofre
as limitações dessas normas, e deve ser entendida
dentro dessas limitações. A grande verdade é
que os críticos desconstrucionistas, todos marxistas,
dão uma dimensão muito maior à Objetividade
Jornalística do que ela realmente tem, atribuindo valores
e ideologias subjetivas desconectadas com o que a técnica
propõe, visando, com isso, atacar o poder, as grandes
corporações jornalísticas e as elites do
sistema capitalista, manipulando os meios acadêmicos para
atingir seus objetivos.
A
Objetividade deve ser debatida no campo da prática jornalística,
não simplesmente eliminá-la porque não
atende à ideologia de intelectuais/jornalistas de esquerda,
mas discuti-la, como propõe Jay Rosen, para adaptá-la
à luz de uma nova realidade:
Segundo
a velha teoria, a objetividade advém da imparcialidade
e da distância. É-se credível porque não
se está envolvido, não se está interessado,
não se tem benefícios diretos. Segundo a nova
teoria da objetividade, a credibilidade é alcançada
porque se está preocupado, porque se está interessado,
porque se importa com o que se passa na comunidade.
A
Objetividade é irmã gêmea e se confunde
com a Democracia. No Brasil, estamos convivendo com essa enxurrada
de denúncias (mensalão, correios) que só
existe porque a democracia brasileira pode funcionar mal, mas
funciona cada vez melhor.
Têm-se
cada vez mais mecanismos de apuração, a começar
de uma imprensa investigativa e independente, que abre espaços
para denunciantes e denunciados, réus e vítimas,
buscando em primeiro lugar a verdade. Agora, se há alguma
falha na precisão, na veracidade, na neutralidade dos
fatos publicados, a responsabilidade é do jornalista,
dos editores e dos donos do negócio, pois a Objetividade
Jornalística tem por princípio que a liberdade
de expressão e de imprensa, própria de regimes
democráticos, seja usada com responsabilidade, ética
e honestidade.
Conclui-se,
portanto, que a Objetividade Jornalística existe, tem
nome e sobrenome, e pôde até ser filmada, como
no caso de Todos os Homens do Presidente (1976), de Alan J.
Pakula, e O Informante (1999), de Michael Mann.
Assim
sendo, é necessário que os dirigentes acadêmicos
se rendam e as Universidades aceitem a realidade de que jornalismo
é negócio, ligado a grandes corporações
de mídia que operam por lucros, que notícia é
produto, interligada num mundo globalizado e a cada dia mais
competitivo, e que precisam revisar seus currículos,
ementas e bibliografias.
Isso
não significa dizer que as Universidades devam abrir
mão de formar cidadãos críticos, agentes
de transformação social. Mas esta visão
crítica não pode estar condicionada exclusivamente
ao marxismo ou outras ideologias de esquerda.
Por
sua vez, os professores, intelectuais e jornalistas que não
aceitam a nova ordem, que buscam subterfúgios e se abastecem
dessas ideologias utópicas que não reportam à
nova realidade, devem trocar de profissão.
Referências
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acessado em 10 de junho de 2005.
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Nelson. O estudo do jornalismo no século XX. São
Leopoldo, Ed. Unisinos, 2001.
Notas
[1]
Foram encaminhados e-mails no dia 04/06/2005 para Clóvis
Rossi, Nélson Sirotisky (ANJ), Alberto Dines, Marcelo
Beraba, Marcos Barbosa, Claudio Thomas e Claudio Tognolli com
as perguntas: Para o Senhor, a Objetividade existe? Quais os
motivos que têm levado jornalistas e escritores a criticar
a Objetividade? Como o seu veículo aplica e/ou implementa
a Objetividade? Todos confirmaram recebimento. Ninguém
respondeu às perguntas.
[2]
Publicada na internet em 26/01/2005, disponível em http://www.tognolli.com/html/mid_categoria.htm.
[3]
Novo Manual da Redação - Folha de São Paulo
- Página 19.
[4]
Articulista do site Mídia sem Máscara, disponível
em:
www.midiasemmascara.com.br/colunistas.php?aid=6.
[5]
Disponível em http://www.adelmo.com.br/index2.htm.
O site disponibiliza também o texto na íntegra
do livro "O Segredo da Pirâmide - para uma teoria
marxista do jornalismo".
[6]
Artigo "Fato vs Texto" - IIº Encontro Nacional
da Rede Alfredo de Carvalho - Grupo de Trabalho: História
do Jornalismo.
[7]
Disponível em http://server.gpeb.ufsc.br/revista/arquivo/entrevista_mai00.html.
*Éverton
Miguel é aluno do Curso de Jornalismo da UFSC - Universidade
Federal de Santa Catarina.
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