Manchetes
Samuel
Wainer:
judeu e jornalista
Por
Karla Siqueira
Samuel,
as Duas Vozes de Wainer, de
Joëlle Rouchou. Editora UniverCidade, 209 pág.
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A
jornalista Joëlle Rouchou, doutora em Comunicação
pela USP e pesquisadora da Casa de Rui Barbosa, lançou,
na última segunda-feira (14/06), no Rio de Janeiro, o
livro "Samuel. Duas Vozes de Wainer".
O
livro traz uma análise das memórias que Samuel
Wainer deixou gravadas buscando a construção de
sua identidade como jornalista e como judeu. Esse livro
é minha dissertação de mestrado. Eu estava
trabalhando com imprensa, comecei pesquisando a revista Diretrizes
do final dos anos 30, editada por Samuel e fui me encantando
com o conteúdo, a edição, a equipe, os
textos, a coragem política, e fui atrás do personagem
Samuel Wainer. Comecei a me interessar também pela motivação
do jornalista judeu e fui atrás do material, do arquivo
do Samuel.
Ele
não tinha esse hábito, mas preparava-se para escrever
sua autobiografia, deixando 53 fitas gravadas. Morreu antes
de poder redigir as memórias. A família transcreveu
as fitas e trabalhei com essa transcrição classificando
todo o material. Buscava como ele se via como repórter,
político, editor, redator, dono de jornal, imigrante,
judeu, homem, pai. Todas as vozes que apreciam em sua fala acabaram
convergindo em dois eixos: o jornalista e o judeu. Exatamente
as duas vozes do título, explica Joëlle.
A
pesquisa, no entanto, não foi simples, mas nem por isso
deixou de ser uma tarefa compensadora. Quando pesquisamos
é como apurarmos uma matéria: o desafio de encontrar
algo de novo, ou olhar diferente que possa trazer alguma contribuição
que, de fato, valha a pena investir no trabalho. Não
era clara essa identidade judaica e fui atrás de uma
intuição de que o fato de ser um judeu imigrante
da Bessarábia tinha um peso importante na vida do jornalista
Wainer, diz a autora.
Através
das páginas do livro, o leitor vai conhecer melhor a
personalidade de Wainer, que fundou o jornal Última Hora
e sempre lutou pela profissionalização das redações.
A obra traz pequenas histórias que ilustram a forte presença
da identidade judaica no jornalista, sua vida em meio a palácios
e intelectuais, sua prisão no Batalhão de Choque
da PM e a cura da tuberculose que o atacou. Busquei as
identidades do jornalista e do judeu.
Em
muitos momentos as identidades se cruzam como na cobertura do
Tribunal de Nuremberg, a matéria que ele faz sobre os
"displaced people" - a população que
logo após a II Guerra não sabe para onde vai,
em que país recomeçar a vida - da fundação
do Estado de Israel, em 1948, por exemplo. O pessoal e o privado
me interessam da mesma forma, explica a jornalista e pesquisadora.
Quanto
às revelações que faz, Joëlle conta
que o livro traz, pela primeira vez em uma publicação,
a explicação de que Saumel Wainer não nasceu
no Brasil, mas na Bessarábia. Por conta de uma denúncia
de Carlos Lacerda sobre a origem européia de Wainer,
criou-se uma crise no governo de Getúlio Vargas. No entanto,
graças a falsos testemunhos de amigos de seu pai, o jornalista
conseguiu provar que nasceu no Brasil e que aqui fez a circuncisão.
Além
do prefácio do jornalista Silvio Ferraz, o livro traz
depoimentos de outros profissionais da imprensa como Alberto
Dines, que trabalhou com Samuel no jornal Última Hora,
e Moacyr Werneck de Castro, companheiro de redação.
O livro deixa Joëlle cheia de orgulho: acho que é
muito gratificante poder publicar uma pesquisa, mesmo que acadêmica
em livro.
É
como se fosse uma reportagem maior do que os limites das folhas
de um jornal ou de revista. O cuidado com a pesquisa é
mais afinado, uma vez que há um rigor acadêmico
que, para nós jornalistas, é uma bela maneira
de nos disciplinarmos e irmos mais fundo.
A
autora já aposta em alguns tipos de público que
serão atingidos pela obra. "No início pensei
nos alunos de Jornalismo, pois é mais um ponto de vista
que complementa o livro de Augusto Nunes 'Minha razão
de viver'. Depois acho que ele é um personagem que, aliás,
merecia uma bela biografia, e que vai interessar contemporâneos,
curiosos da comunidade judaica também" finaliza.
Fonte:
Site Comunique-se, 27.06.2004.
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