Dossiê |
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QUARUP
- parte 10
Em seguida vieram as manifestações do
Prof. Ciro Teixeira Correia, presidente da Adusp, na Celebração
à memória do Prof. Jair Borin:
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Solidariedade
e carinho à
esposa e aos filhos Ivan e Paula
Por
Ciro Teixeira Correia*
Em
primeiro lugar gostaríamos de externar todo nosso carinho
e solidariedade para com os familiares do Jair Borin, através
da entrega por parte de representantes da diretoria da Adusp
e dos nossos funcionários, de um buquê de flores
para a Sílvia, sua esposa, ao Ivan, seu filho e à
Paula, sua filha.
O
Jair foi presidente da Adusp e foi sempre um companheiro muito
determinado nas defesas das causas que abraçou, muito
solidário e muito afetuoso para com todos com quem convivia.
Caso já tivéssemos nós obtido êxito
nas muitas lutas em que o Jair militou, teria ele sido diretor
dessa casa, a ECA, e reitor da USP, pois para ocupar esses cargos
foi eleito por ampla maioria sobre os demais concorrentes em
pleitos abertos e democráticos.
Infelizmente
a voz e os votos de professores, funcionários e alunos
não preponderaram nessas ocasiões sobre as estruturas
autoritárias ainda em vigor na nossa universidade e,
também na nossa sociedade, e o exemplo da vida do Jair
apenas contribui para reforçar em cada um de nós
o compromisso para continuar a lutar pelos mesmos ideais que
sempre pautaram sua conduta.
Para
registrar o modo particular e decidido com o qual o Jair abraçava
suas causas penso que não seria capaz de oferecer melhor
testemunho que um texto escrito pelo próprio Jair, na
época na presidência da Adusp, quando do lamentável
incidente que culminou na morte do menino Daniel de Araújo,
na raia de remo da USP, no dia de Finados, em 1997.
Sobre
o incidente que muitos preferiram menosprezar, e que até
hoje não teve o devido esclarecimento para a comunidade,
o Jair e a Adusp lutaram para que fosse devidamente esclarecido
e suas razões e significados compreendidos no sentido
de, ao fazê-lo, estar assim agindo na direção
de transformar nossa sociedade em um meio mais justo e acolhedor
e, não excludente como infelizmente tem se constituído.
Passo
a ler então os principais trechos do artigo "O segundo
incêndio da USP" de Jair Borin, conforme publicado
na Folha de São Paulo de 10/11/97:
"A
USP ardeu duas vezes, ambas de forma trágica e contra
o autoritarismo. A primeira em 1968, na Maria Antônia,
no auge da resistência à ditadura militar. A segunda
na última quinta-feira, quando grupos de garotos excluídos
socialmente passaram a depredar prédios, queimar guaritas
e destruir o muro de três metros de altura, símbolo
de uma administração do campus que insiste em
isolar a universidade da comunidade que a envolve".
"A
USP é dos bacanas; nós também somos gente."
Esse era o refrão dos garotos da favela Jardim São
Remo e de outras comunidades próximas ouvido nas manifestações
de protesto contra a morte do menor Daniel Pereira de Araújo,
de 15 anos, que pulou o muro na tarde de Finados para nadar
na raia da universidade.
A
elite universitária, a exemplo das demais elites do país,
prefere fechar os olhos aos graves problemas sociais a encará-los
e procurar soluções. Apenas os que já têm
poder e prestígios são chamados para o banquete.
Para eles, tudo. Das melhores condições de vida
às vagas nos melhores cursos universitários das
nossas faculdades públicas, gratuitas e de qualidade.
Para os pobres, os negros, os sem-terra, a exclusão social,
a repressão.
O
sentimento de exclusão social marca profundamente o jovem
adolescente, talvez mais do que o adulto, já sofrido
e calejado. Morar ao lado da USP, ver o seu centro de práticas
esportivas, campos de futebol, quadras, piscinas, jardins e
não poder freqüentá-los magoa profundamente.
E, embora despolitizados, muitos desses jovens sabem que tudo
isso é mantido com a verba de tributos que incidem mais
pesadamente sobre a população de baixa renda.
A
mágoa represada explode muitas vezes num protesto efêmero,
violento, não raro devastador. Infelizmente, a USP ardeu
motivada pela morte de um menor que se banhava nas águas
proibidas de seu lago reservado, apenas, para a prática
do remo, esporte inacessível ao povão.
Na
favela São Remo, onde moram em condições
precárias cerca de 2.000 famílias, muitas delas
de servidores da própria universidade, dor e revolta.
Enquanto
a elite que pensa o país continuar achando que basta
um muro de três metros, com uma segurança mal treinada,
para defendê-la do assédio dos excluídos,
a barbárie se ampliará por todos os segmentos
da sociedade. Ela está aí, todos os dias, na rebelião
nos presídios, na Febem, nas ruas da cidade e, agora,
no interior da maior universidade pública do país."
Ao
Jair todo nosso respeito e gratidão pelo convívio,
pelos ensinamentos, pela sempre presente disposição
em partilhar com todos sua visão da sociedade e sua determinação
em contribuir para sua transformação. Ao Jair
nosso compromisso de continuar a lutar essa mesma luta.
*Ciro
Teixeira Correia é presidente da Adusp.
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